domingo, 1 de maio de 2011

Depoimento

Tenho 20 anos e moro em Belo Horizonte - MG.

Não sei ao certo quando comecei com a doença. Desde pequena sempre me senti diferente, gordinha. Tinha vergonha de usar short e vestidos curtos. Isso passou por um tempo. Aos 12 eu já tinha um corpo bonito, diferente das outras meninas, e a sensação de ser mais bonita ajuda a manter a neura longe. Só que isso mudou com o tempo também. Comecei a me sentir feia, mal comigo mesma. Olhava no espelho e via uma imagem de uma adolescente gordinha, com espinhas e aparelhos nos dentes. As minhas amigas já tinham passado essa fase, estavam bonitas, magras. E eu voltei a ter vergonha de tudo. Saía só de calça jeans e camiseta, blusa de frio sempre que possível. Não queria me mostrar, não queria aparecer pra ninguém. Procurava dietas em todas as revistas e comecei a admirar cada vez mais as modelos, magras, lindas, perfeitas. Eram o que eu queria ser. Então eu resolvi buscar isso, custasse o que custasse.

Com 17 anos cheguei a pesar 45kg, e minha mãe, meu namorado e minhas amigas começaram a se preocupar mais do que o normal. O que antes parecia só uma brincadeira, o papo de menina que quer fazer dieta e emagrecer, estava ficando sério. Eu olhava no espelho e já sorria pra mim mesma, via ossos aparecendo por toda parte e isso era uma vitória, mas ainda não era suficiente. Comecei a reduzir ainda mais o que comia, uma refeição no dia com calorias contadas era o que eu precisava pra alcançar os objetivos. Não queria mais sair para restaurantes ou barzinhos, não queria comer nada que fosse parar em qualquer lugar do meu corpo. E toda essa luta acabou se tornando uma gastrite. Não contei pra ninguém sobre as dores no estômago, sobre a azia, sobre a falta de vontade de comer. Com o tempo fui vencida pela força dos outros, fiz o tratamento pra gastrite e acabei engordando 12 quilos e isso foi o fim pra mim. Subia na balança todos os dias e via a marca de 57kg me aterrorizar. Chorava todos os dias, não queria novamente usar roupas que mostrassem o desastre ambulante que eu era. A neura voltou, com tudo, mais forte do que nunca.
Cheguei a tomar 11 comprimidos de laxante todos os fins de semana. Passei dias tomando água, se sentia tontura ou dores de cabeça mascava um Trident. Driblava todos no serviço, em casa, na aula. “Já comi” era a mentira mais usada na época. O total de refeição dos meus dias não podiam passar de 60kcal, se passasse era motivo de descontrole: choro, vômitos, laxantes. Um caderninho com dietas e fotos de “Thinspos” (thin + inspiration = thinspiration: inspiração magra) andava na minha bolsa. Nesse mesmo caderninho eu contava todas as calorias que ingeria. Estava conseguindo emagrecer de novo, todo o esforço estava valendo a pena. Porém o esforço trouxe novas complicações: a gastrite piorou, os refluxos aumentaram por causa dos vômitos, tive problemas no intestino por causa dos laxantes, tive anemia pela falta de nutrientes. Meu organismo já não trabalhava como devia.

A depressão veio sem que eu percebesse e de repente me vi isolada de tudo e de todos: brigas constantes em casa, namoro em risco e amizades também. Nada disso era suficiente pra me fazer parar. Continuei até que minha mãe voltasse a perceber tudo, encontrou os laxantes, descobriu meu blog, e fez da minha vida controlada o inferno. Fui em todos os médicos possíveis, fiz todos os exames e tentei o tratamento com psicólogo. Segui todos os tratamentos, contra minha vontade, menos o psicólogo, que rejeitei na segunda consulta.

Não sei dizer como caiu a ficha de como eu me prejudiquei com as minhas neuras. Comecei a ler livros sobre anorexia e bulimia e vi que estava matando a mim mesma. Com o tempo, com o apoio da minha mãe, das minhas amigas e do meu namorado consegui perceber que precisava me controlar. Hoje, peso 51kg e meço 1.62m. Ainda não me sinto bem, ainda quero emagrecer. Mas hoje eu tenho consciência do risco que eu corri. Às vezes ainda perco o controle. Às vezes me pego abraçada com o vaso sanitário botando tudo que comi pra fora, a tabela de calorias está decorada na cabeça e ainda tenho os comprimidos de laxante aqui.

Percebi que a anorexia mora aqui dentro. É impossível ela sair, Anna, minha amiga ou inimiga? Só que hoje sou mais forte que ela. Não quero que ela me domine. Não quero mais ser doente, não quero sofrer mais.

Levo uma vida de altos e baixos. Desejos contra vontades. Sonhos contra realidade. Quero ser magra, mas quero ser saudável. Quero ter minha vida, feliz. Quero me sentir bem.

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Agradeço desde já a essa menina tão incrivel, que permitiu que postássemos teu depoimento.


Colaborador: Aline.

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